sexta-feira, janeiro 09, 2004

antes que a confusão do mês de Janeiro comece (exames, trabalhos, horas de sono perdidas), é preciso aproveitar cada momento que o ano velhinho nos oferece. parece que se despede de nós, dizendo: "bem, apesar das dificuldades, trago-te sempre estes diazinhos finais, em que esqueces a crise na economia, os casos de pedofilia e as greves da Carris e te divertes e passas tempo com quem mais gostas".
com a família presente, nada do que menos agradável se passou (e do que virá pela frente) parece ter expressão. congelamos os desgostos, as decepções, as tristezas e abrimos os braços ao novo ano que, tão amavelmente (queremos crer), nos espera!

em Lamego, é da tradição, a casa da Cocas (ou Pensão Aninhas, como é conhecida por aquelas bandas) enche-se de gente. ou melhor, de Paivas (que é melhor distinguir esta espécie cheia de particularidades): pequenos e grandes (e médios, como eu), gordos e magros, sisudos e galhofeiros, pacíficos ou "embirrões" (raio de palavra havia ela de inventar), a verdade é que somos nós, estamos juntos e a festa começa! :)deixo aqui descritos momentos, fragmentos de tempo que não voltam, mas que marcaram. que se repetem indefinidamente todos os anos, sempre com sabor a pouco.

a confusão na cozinha, onde todos damos palpites, metemos a mão na massa, cheiramos os fritos de abóbora, fazemos os docinhos da época e rimos. mas rimos muito, como se não houvesse mais mundo, como se o espaço fosse só nosso e o tempo parasse para nós.
o bolo de aniversário atrasado, decorado a rigor e com o ingrediente essencial: o carinho. e o olhar emocionado da Zeza, que estava longe de pensar que o bolinho que ajudou a tirar da forma (outras tantas gargalhadas pela teimosia do dito) lhe era inteiramente dedicado.
as conversas até tarde com a Bilocas, os segredos de adolescentes que partilhamos às 2 horas da manhã (sim, os bocejos do dia seguinte tinham uma origem, Cocas)...e os conselhos, os sorrisos, as palavras de compreensão. porque o nosso mundo, o mundo onde a imaginação mais jovem habita, é ainda tão complicado...e vamos sentir saudades.
os passeios de carro, sujeitos a manobras perigosas, a buzinadelas enervadas de condutores impacientes (ninguém me convence que aqueles óculos fundo de garrafa e aquele ar de atrasado mental o iam levar longe...mas, sim, é verdade, escusava de ter roçado o carro do senhor), os avisos sobre o travão de mão, as subidas e estacionamentos complicados.
os almoços e jantares, tarefas divididas e sempre tão alegremente concretizadas por todos (se bem que em alguns casos...).
as matinés sempre animadas, recheadas de bombons, interrupções a meio dos filmes ("importam-se de estar calados?"), comentários estonteantes que nos desviam a atenção...mas no final, ele não morreu e viveram felizes para sempre!
o café na Serra e a tarde passada às voltinhas com a Joãozeca, a fotografar esculturas, estátuas, camiões do Pingo Doce, a comer chocolates e a ver o primo Diogo a encher a pancita de Cerelac e a gozar connosco.
os telemóveis cheios de fotografias malucas, tresloucadas, dementes, mas que marcam para a posteridade aqueles segundos só nossos.
a cabeleira do Nuno, que tanta risota causou, ao passar por 1001 cabeças ("Maria Adalgiza!!").
o arroz de feijão do Mezio...e o dia cinzento, que depressa convertemos num dia colorido.
a ida a Lobrigos, rever os primos, os tios...e comer o bolo de chocolate que só a tia Adelaide sabe fazer.
a história da tia que foi pintar o cabelo e acabou no hospital, a soro (pensava a nossa Pipas que aquilo ia dar para o torto, que eram precisas duas macas - uma para a tia, outra para os seus peitos avantajados - e os hospitais andam em crise).
o Zequinha que, ao colocar os meus óculos, me pergunta se tenho sinusite nos olhos.
as idas às compras (a prenda do tio, a frutinha que falta, ai que lá me esquecia do cacete para as rabanadas).
a má língua na cozinha, enquanto se faz a sopinha e se descasca no chefe e na colega Helena.
ah, e claro, a maravilhosa e milagrosa máquina de massajar varizes!

e entre tantos e tantos outros momentos, a contagem decrescente para 2004, onde entrámos juntos (com passas, champanhe, nota na mão e em cima de uma cadeira)...para assim permanecermos. e poderia eu relembrar tantas outras coisas, mas quem lá esteve sabe do que falo...e sente a mesma saudade.

num local onde o tempo não passa, onde os dias são calmos, porque não temos que correr (atrasos para as aulas, para o emprego, para apanhar os transportes, para apanhar a padaria aberta, para o homem do talho não vender as iscas que encomendei, para isto e para aquilo). porque podemos falar, guardar uns minutos para partilhar o que vivemos. porque talvez a vontade de estarmos juntos seja maior que tudo o resto...