quinta-feira, setembro 30, 2004

há imensas coisas que nos tornam pessoas mais felizes. normalmente, são aquelas que, para os que nos rodeiam, não têm a menor importância. mas preenchem-nos e, acima de tudo, é preciso respeitá-las.

ontem, ao meu lado no comboio, sentou-se um casal jovem. ela, com ar de pindérica-com-o-soutien-de-fora-que-dava-para-ver-o-lacinho-no-meio; ele, com ar de idiota a ajeitar-lhe o top e a compor-lhe 'os peitos'. enfim...
pela conversa - eles falaram alto, não sou eu que sou cusca -, percebi que se referiam a um concerto qualquer. o rapaz pôs o ar mais inocente do mundo e parecia uma criança com um brinquedo novo. "eu vou lá estar!", repetia vezes sem conta. a namorada, coitada, a quem a vida não deve brindar com muitas alegrias, respondeu-lhe: "o mundo a desmoronar e tu tão feliz por causa disso"!!

pus o meu ar mais desconcertante e de censura e olhei-a nos olhos, como que a dizer: "olha lá, ó minha estúpida, e desde quando é que se instituiu que a felicidade é padronizada? se calhar tu ficas feliz com uma queca, o teu homem contenta-se com um concerto". ou talvez a pobre diab'a' seja infeliz desde que nasceu...porque desde que o mundo é mundo (e certamente desde que ela se conhece como pessoa) que a paz mundial é uma utopia!

***
eu, por exemplo, fico feliz com momentos. alguns instantes em que sinto a vida tão plena, que a agarro e guardo para sempre essa intensidade tão única.
uma palavra de quem não espero, no sítio e na altura mais inesperadas. um dia de sol. um passeio na praia, junto ao mar. um texto que me faça rir ou chorar, mas que me toque acima de tudo. um bom filme. aquela música naquela altura certa. um sorriso de uma criança. ajudar quem precisa e receber na volta um 'obrigado' sincero. uma conversa de café que dura horas e nem dou pelo tempo voar. uma surpresa. o Benfica ganhar um jogo (hihi). um prato maravilhoso. uma fotografia. a vida preenchida de cores e eu a aproveitá-la para sentir que não passou apenas, mas que fiz parte dela.

ou, simplesmente, aquela presença ao meu lado. sem falar, porque estar ali já vale o mundo. aquele que vive em guerra, mas onde construímos os nossos momentos de paz...e somos felizes.

terça-feira, setembro 28, 2004

bem, há dias em que só me apetece ter um buraquinho bem escondido para me enfiar. consigo sempre 'enterrar-me' sozinha :$
estava eu sentadinha à porta da sala de aula, em amena cavaqueira com as minhas meninas, quando entra 'o homem': lindo, louro, alto, olho azul...e com um sorriso de derreter qualquer alminha!
enfim, com aquele ar, vimos logo que o 'deus' não podia ser português. mas o que não pensámos na altura - e teria ajudado se puséssemos os neurónios a trabalhar - é que ele soubesse a língua. CLARO que um Erasmus deve saber um mínimo de português ou não viria para cá...:$
então vá de fazermos comentários em frente ao rapaz, num tom de voz que ele só não ouviria se fosse surdo. o jovem lá se ria e tal...mas não se desmanchou. eu a tecer os elogios mais...como direi...lascivos :$ e a Raq a discordar com tudo o que eu dizia. e ele a perceber TUDO!!
a seguir, a melhor (?) parte...o belo exemplar masculino (tirado de um paraíso perdido na terra...no caso, a Dinamarca) foi-me apresentado por uma colega de Erasmus italiana. acho que ainda estou corada agora...e acho que ele ainda se está a rir de nós.
quando precisar de integração, apontamentos ou informações, voluntárias é o que não falta. e se não souber alguma palavra ou expresão portuguesa, podemos sempre recorrer
à eterna linguagem universal... ;)

segunda-feira, setembro 27, 2004

ele há dias tramados. então aqueles que começam de madrugada e quando se chega ao fim do dia ainda há coisas para resolver, mails para enviar, jantar para comer, ... baaaaah! é o regresso à loucura das aulas. e este ano, o último, ainda acrescentei 1001 coisas ao horário...1002, se contarmos que tenho que respirar para conseguir fazer tudo :)
são estes os melhores dias. só não deixam muito tempo nem imaginação para escrever. mas como o blog andava um pouco abandonado, não resisto em deixar novamente um excerto do livro que me acompanha agora para todo o lado - no comboio ou nos intervalos para respirar dá jeito. :)

"Ainda que os meus olhos não a vejam, eu vejo-a. Pensa. No que pensas, mulher? Quem é o teu rosto? E não há um silêncio que me responda. Só o silêncio onde não me entendo, onde não a ouço. Só um silêncio de esquecimento e indiferença e silêncio. Distante deste tubo de sol e junto da minha pele, vagueia pela casa, talvez perdida, talvez segura do que sabe. Preciso dela. Não a conheço".

José Luís Peixoto, Nenhum Olhar

terça-feira, setembro 21, 2004

às vezes, as palavras dos outros espelham o que sentimos...e como não sei reproduzir melhor, aqui fica este excerto...

"Os carvalhos muito grandes. As estrelas espalhadas, as nuvens a passarem como pessoas tristes, o céu da noite sem lua, o céu da noite escuro e sem lua. Eu acreditava que o amor é a inocência sufocada mil vezes na vontade ridícula de desejar que o céu compreenda. E a cidade lá ao fundo, uma extensão de luzes pequenas, de vidas, de pessoas enganadas. Caminhava perdido de mim. Os meus passos a quebrarem ramos pequenos. Os meus passos no chão grosso de folhas de carvalho. O cheiro vegetal do musgo, da resina e da água. Caminhei muito entre sombras. Cada vez mais longe de mim, cada vez mais dentro da escuridão obsidiante do medo."

José Luís Peixoto, Uma Casa na Escuridão

segunda-feira, setembro 20, 2004

não sei bem o que se sente quando uma pessoa que nos é próxima está perto do fim. acho que um dia terei descobrirei. mas não agora. não enquanto não tiver consciência de que isso é possível.
acho que nos habituamos a olhar para as pessoas e senti-las. não importa de que forma, mas sentimo-las...o que quer dizer que estão vivas. e depois? será que quando nos deixam - para sempre - fica um vazio?

***
soube há meses que a mãe de um amigo meu - que conheço bem - está gravemente doente. quando os médicos lhe deram pouco tempo de vida, ela surpreendeu-os e disse 'não é ainda a minha hora'!
hoje, está irreconhecível. o aspecto físico é triste. a expressão de sofrimento. mas a única coisa a que não renunciou foi à luta.
o marido chora, mergulhado num desespero que não condeno, que não conheço. ela, à beira do abismo sem retorno, anima-o, transmite-lhe a força que não tem, mas que alguém providenciou para si.
os filhos...estou muito longe de estar próxima àquilo que sentem, que vivem. ou sobrevivem.

***
cada dia é uma vitória. cada noite um tormento sem fim. e cada minuto é descontado num silêncio de medo. um medo escuro, que sufoca e fere.
o céu espera mais uma estrela. mas não é para já. há ainda um pouco para viver aqui...há sorrisos que ainda não nasceram, há também um amor inacabado. e há uma esperança infinita...enquanto durar.

quarta-feira, setembro 15, 2004

há gritos mudos que ecoam no ar e que é difícil ignorar. um rosto triste, desfigurado, que afasta a expressão natural de uma alma que enche o mundo e deixa apenas espaço para a solidão.
uma desilusão que tolda a mente e apaga os bons momentos vividos...é o suficiente para nos enfraquecer e empurrar para o poço da mágoa.
é nesta altura que nos faz falta quem mais amamos. quem respeitamos. quem nos admira. quem, às vezes sem ter disso consciência, nos agarra e puxa para cima.
porque é lá o nosso lugar. porque queremos ser felizes, juntos.

estou a caminho. para ti, que esperas, nunca pareceu tão longo. mas vai passar a voar e, quando tornares à realidade, tudo é diferente. um dia de cada vez. primeiro um esboço, depois o sorriso.
e há-de haver aquele instante em que vais sentir de novo que há um cantinho para ti num lugar que ainda não conheces. mas que é teu porque o mereces.
se eu puder contribuir com este bocadinho que aqui levo guardado, então ficarei feliz.

olha miúda, tens que aprender que cada manhã nos reserva um futuro tão próximo quanto indecifrável. e que só depende de nós construí-lo. infelizmente, nem sempre escolhemos as pessoas certas para nos acompanharem...mas isso só descobrimos quando as deixamos entrar.
mesmo que nos desiludam, deixam sempre algo de bom e é a isso que temos que nos agarrar.
para acreditar que outras virão e farão parte de nós para sempre.
és GRANDE e sabe-lo! e um anjo...és um anjo Piwi :)

terça-feira, setembro 14, 2004

Ouviste as luzes que se ergueram no céu? Não se ouvem...? Então tratou-se de um sonho? Mas era tão nítido aquele som, aquele clarão.
Uma melodia infinita, que acompanhava as estrelas e se desfazia depois, lentamente.
No céu ficava apenas um rasto, um traço distante que deixei de ouvir. Os traços ouvem-se?
Quando vi que aí vinhas, pintei-o de azul, para que a escuridão não revelasse o meu segredo. E escondi aquele som, guardei-o num baú, aquele onde só as coisas importantes têm lugar.
Foi como esconder um sonho, não queria que soubesses da sua existência. E, afinal, descubro agora que era só isso...um sonho. Pensei que só podia ter dele uma memória que o tempo vai ofuscando e apaga. Mas trago na mente aquela cor e a música diferente de todas as músicas que conheço.
E apareces tu. A tua voz é tão nítida. A tua imagem tão real. Não eras um sonho nem estavas no céu. Caíste à minha frente e não te quero prender. Não quero que pertenças ao baú de recordações.
Fica, gosto de ti.

segunda-feira, setembro 13, 2004

não podemos entrar na vida de ninguém sem pedir licença. é preciso que nos abram uma porta - às vezes basta que fique entreaberta - e que nos dêem um espaço. eu não pedi nada. foi espontâneo, uma espécie de acordo mútuo virtual. entrei...entrámos naquele espaço e invadimos sorrateiramente uma vida que não era nossa, mas que queríamos conhecer.
sempre achei que a melhor parte de uma relação é essa...há uma sedução estranha que nos acolhe, que saboreamos tão delicadamente quanto ela parece envolver-nos. é o início.
não tenho ainda a certeza onde acaba. mas é efémera. julgo perceber ali uma fronteira em que as relações se alteram.
quis dizer-te isso naquele instante. era a única coisa que faria sentido dizer. parecia uma nuvem a pairar à minha volta, a esconder-me. e era apenas o que eu queria. não consegui que as perguntas corressem da mente para as palavras que tentei delinear para ti.

sabes, cada segundo em que nos olhámos pareceu uma eternidade. tenho a certeza de que o tempo pára para nós e impede o mundo de avançar. naquele momento, a perfeição existe. tem um nome, mas não to posso dizer - fica na intimidade do pensamento, eu sei que a respeitas.
continuo a olhar-te. conseguimos ver muito para além da superficialidade que aparentamos. como se as palavras se tornassem ocas, vazias, e tudo o resto, o que vagueia na alma, se espelhasse por completo. às vezes não queria que fosse assim. há coisas que te queria esconder...não por um engano surdo que te quero impor (tu sabes tudo e ainda assim foges), mas porque a alma pode incomodar.
há momentos em que não te suporto. levas um segredo contigo e afastas-te, como se ele doesse. quando tudo o que quis era que ele nos aproximasse. aos poucos, talvez, vislumbro um sorriso que chama, sem imposições. vais mantê-lo?
enxuguei os olhos. nunca mais permiti que deitassem uma lágrima. não por nós. vês aquele caminho? é por onde vou, sem destino certo. quero que me sigas. lá ao fundo só haverá espaço para esse abraço terno que há muito se esconde. vamos suprimir novamente as palavras e cair num silêncio que foi feito para nós.
deita-te aqui ao meu lado e diz-me que estamos no início. vamos seduzir-nos e deixar que o relógio fique ali, quieto, mudo. sei que não vou acordar, porque estás ali. e isso basta-me.

sexta-feira, setembro 10, 2004

não gosto muito de elogios. tenho alguma dificuldade em lidar com eles e perceber o que fazer. normalmente, a primeira reacção é corar - é inevitável. logo em seguida, surge a dúvida: e agora, agradeço ou retribuo? ou ambos? e depende da pessoa ou da situação em que o elogio é feito? e foi dito com sinceridade ou são só palavras de circunstância?
(a propósito, se algum de vocês souber como reagir acertadamente nestas alturas, faça o favor de me dizer!)
não vou ser hipócrita e dizer que não me sinto bem. "essas calças ficam-te a matar" ou "gostei muito do teu trabalho" sabe sempre bem ouvir. mas depois há também a distinção: ou o elogio é para a pessoa ou para o seu trabalho. em relação a este último, fico muito contente quando ouço uma apreciação positiva. é nos outros, os que se dirigem a mim, que está a dificuldade...não sou uma pessoa que cora facilmente (pois...vocês sabem), por isso fico muito aborrecida quando os outros percebem que fiquei atrapalhada. baaaaaaah!

não sei o que se passa com o mundo, mas de há dois dias para cá já ouvi uns quantos elogios. das pessoas mais inesperadas...e nas situações mais estranhas. tenho que confessar que corei com dois...porque foram exactamente aqueles que não me importo de ouvir...os únicos! fazem-me sorrir e o ego dispara por aí acima (e só pára quando volto à terra e penso..."foi um elogio").

é bom ouvir uma palavrinha simpática de vez em quando, mas continuo a achar que as acções que os outros têm connosco valem infinitamente mais. são mais espontâneas e ficam mais tempo na nossa memória (e se eu tenho memória selectiva!).
deve ser por isso que tenho um problema grave em lidar com as palavras dos outros...porque um gesto não pede um agradecimento imediato. e porque muitas vezes as palavras são ocas, são apenas palavras que vêm e vão. é isso que nos distingue a todos: alguns recordamos sempre, outros passam e simplesmente apagamos.

quinta-feira, setembro 09, 2004

um acaso chamado Kate Walsh..."it's never over"...

Well, it seems like I’m losing
All the time
I gotta run up a bill
Till this dark horse is leaving
And I know you’ll be leaving

But a memory of distant diesel nights
You put a crown on my head
But I’m wishing you never had
‘Cause now I’ve less than I ever had

But I know
When this street lamp fades
You’re scheming up your next parade
And the time slowly climbs
Till you’re there

Dazed, darken my days
I watch you play your prey
It’s never over
I’ll be waiting here wishing you over here
Seize destined means
How long you’ll play unfair
It’s never over
I’ll be waiting here wishing you really cared

When I’m seeing that look
That’s in your eyes
You know I will be here
I’ll be giving you anything
Always giving you anything

But I know
When this street lamp fades
You’re scheming up your next parade
Then you’re gone
Creeping home
And this feeling creeps in alone

Dazed, darken my days
I watch you play your prey
It’s never over
I’ll be waiting here wishing you over here
Seize destined means
How long you’ll play unfair
It’s never over
I’ll be waiting here wishing you really cared

It’s never over

segunda-feira, setembro 06, 2004

ouvi um som que vinha dali. espreitei e não te vi. talvez estivesses longe e era só a minha imaginação que te procurava. ou estás mesmo aí, escondes-te?
deixei-te no mesmo sítio em que te encontrara, mas fugias. não era já como no princípio, em que caminhávamos na mesma direcção. era só uma forma diferente de a encarar.
eu achava que podíamos dividir os traços e apoiarmo-nos neles sem muito esforço. tu dizias-me que não, que só há uma linha certa, que não podemos desviar-nos sem fazer barulho.
um ruído estranho e estavas do lado de lá. como num espelho, só me via a mim. e descobri-te, lá ao fundo, acenavas-me com indiferença. como se me dissesses que as regras eram tuas e só tu as podias quebrar.
li de novo as tuas mensagens, recordei todas as palavras e ainda não havia sentido naquela fuga. quero-te perto. vais voltar?
há um espaço por preencher e é teu. há um olhar para o horizonte e é nosso. há uma certeza de que pertences aqui...e ainda vive.

sábado, setembro 04, 2004

cada minuto que passava era uma esperança. mas podia ser também o último. a fome, a sede, o calor...o medo, o terror.
centenas de pessoas viam a vida escapar por entre os dedos. num dia normal, seguiam o seu caminho, retomavam a rotina que o mês de setembro sempre devolve...e acabaram com lágrimas, com receios e, muitas, sem vida.
subitamente, o mundo já não existe. deixou de ser o refúgio que lhes é destinado e agora só têm aquele canto, onde as pessoas se amontoam.
tudo o que vêem são armas. e respiram ódio, muito ódio naquelas mentes perversas e sujas, que os prendem num acto de loucura. a inocência também os abandonou. descobriram o que é viver no pânico e as imagens não cessam, ficam para sempre gravadas num (in)consciente que não deixa espaço para o sonho...somente o medo. e as feridas, tantas, abertas e sangrentas. de novo o medo e a angústia e a tristeza e a raiva e um turbilhão de emoções que não conheço, que não
imagino. e, no fim, a morte.
e para sempre a imagem de um soldado que chora, abraçando uma criança morta que não deixou de ser um anjo...e que, cedo demais, abriu as asas para nos abandonar.